Chamava-o de mansinho, sempre que passava em frente à sua porta.
Nunca recusou os seus convites para entrar, e ao fazê-lo, quando ainda entre portas, notava acender-se uma chama no seu olhar.
Ainda antes de a porta se fechar, enlaçava-o nos seus braços e apertava-o contra o peito.
Sentia então, que todo o seu corpo tremia como o de uma criança abandonada na noite escura.
Abraçava-a também com ternura, como se quisesse protegê-la de medos, de terrores que não sabia.
Nessa altura, erguia o seu rosto que escondera no peito dele ao chegar, fixava-lhe o olhar nos lábios e aproximava os seus devagarinho. Tocavam-se as duas bocas como pétalas de flor, entreabriam-se, beijavam-se, primeiro com doçura e uma leveza que logo depois se transformava em sofreguidão, em querer sem medida, em paixão ardente.
Era quando comaçava uma dança de corpos que se desejavam.
Em movimentos de espiral, rodopiavam até ao quarto, de olhos cerrados, bocas coladas sem errar o caminho, parando a espaços, pressionanado-se mutuamente contra a parede.
Ao chegarem, já sem roupa, lançavam-se num leito espaçoso, iluminado pela luz do sol que jorrava pela janela aberta para o jardim.
Amavam-se!
Amavam-se ternamente, por inteiro. Entregavam um ao outro a essência de si mesmo, numa troca sem receios nem medidas, até que todos os músculos e tendões não suportassem o esforço dos movimentos.
Então os corpos frôxos, deitados lado-a-lado, as mãos entrelaçadas, experimentavam a sensação que descreve o paraíso. Era quando ele notava os aromas florais que chegavam do jardim e o cheiro a feno e alecrim que se soltava dos lençois alvos, o palco de um amor intenso, mas sem sons. Um amor mudo, como que saído das profundezas da terra.
Então, o corpo dela, alvo, nu, começava a agitar-se levemente num soluço que crescia, transformando-se no pranto convulsivo de criança-menina a quem roubaram a sua boneca mais querida.
Ele, levantava-se de mansinho, pegava as roupas sem ruído, vestia-se já junto à porta e saía.
Ela, enrolada sobre si mesma, chorava e chamava pelo nome do amor que a morte lhe roubara.
Ele... voltava a passar em frente à sua porta.
;)
terça-feira, 24 de julho de 2012
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6 comentários:
Ai, fiquei tão curiosa. E obrigada! Mas, agora, estou aqui de fugida, voltarei logo ;)
Um conto lindíssimo, Bartolomeu.
Só não entendi o que tem a ver com a superstição...
Então, Cristina... porque na estória existe um sentimento de veneração, fundada no temor e que conduz à quimera.
Digo eu, não sei... ás tantas não estou a ver bem a coisa...
;))
Mas pronto, o que interessa é teres gostado do conto.
;))
Sim, a superstição assenta sempre num temor, o que nos leva a cumprir certos rituais, ou a evitar certas situações. E aqui há, também, o cumprimento de um ritual, é verdade, que, como dizes, conduz à quimera.
De qualquer maneira, o conto é lindíssimo. E, mais uma vez, obrigada pela dedicatória :)
P.S. Eu sou uma medricas, Bartô ;)
Em todos nós habita alguma espécie de medo, Cristina. Até os mais valentes não o conseguem evitar por completo.
No entanto, o mais importante, é que os medos não superem a nossa força de vontade e condicionem as nossas acções e decisões, de resto, até nos podem ser úteis, na medida em que nos ajudam em certas circunstâncias a evitar perigos maiores.
;)
Palavras sábias, Bartolomeu.
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