sábado, 16 de julho de 2011

Insaciabilidade(s)

«A insaciabilidade dos desejos humanos obriga a dar voltas que não conduzem a outro lugar que não ao ponto de partida.»
Penso que o sentido, ou os sentidos desta frase, podem ser aplicados a diferentes situações em diversos contextos.
A frase termina com uma afirmação, que para o ser, obriga a que não seja considerado somente o ponto de partida, mas também, o ponto que se pretende, seja o ponto de chegada.
No entanto, o ponto de chegada é indeterminável. Indeterminável por diversas razões; porque se não consegue divisar, porque se não consegue idealizar e ainda, porque é impossível de concretizar. Mesmo depois de supostamente atingido, esse ponto de chegada, continua por atingir, porque se mantem em permanente construcção, em permanente actualização, em permanente "crescimento".
Então, poderei resumir que o ponto de chegada é o Homem, e que o ponto de partida, é o homem... ao caminho que intervala entre o homem e o Homem, poderemos chamar "a insaciabilidade dos desejos"...?
A administração do blog ceita sugestões e, ou, reflexões.
Rejeita conclusões.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

À conversa com Ricardo Reis

«Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive»

Para ser grande, sê iconoclasta: nada
Que não seja a vida, te basta.
Sê em cada coisa símbolo de ti . Porque
Em cada coisa eu te vi.
Assim, serás eternamente tu, em ti.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Os Freixos e o Mundo

Encontrei hoje muito cedo (para mim), o meu vizinho Manuel do Freixo.


Vinha pela estrada poeirente, de enxada ao ombro, corpo vergado, mais pela tristeza que pelo cançasso. Parei e saí do carro para o cumprimentar.


-Então sô Manel, que tal a vida ?


-Cá se vai vizinho (e nem mais uma palavra).


Cogitei com os meus botões; será que o sô Manel está doente, ou com algum problema a afligi-lo?


-Isso não me parece lá muito bem sô Manel, parece-me que você vai meio aborrecido...


-Na senhor... coisas da vida...


-Mas está alguem doente?


-Na senhor, felizmente cá se vai andando da forma que Deus quer...


Mudei de assunto e perguntei-lhe pela agricultura. Que lá ía tudo da forma que Deus manda o tempo, que se não piorasse, assim estaria muito bem. O sô Manel do Freixo, é uma pessoa muito faladora e sempre com um sorriso franco e enorme a bailar-lhe nos lábios e nos olhos. Desconfio, pelos olhos claros e um certo ar, que será ainda descendente de algum militar das tropas de Massena que premaneceram acantonadas por estas bandas, no tempo das últimas invasões francesas. Talvez trineto de alguma moçoila trigueira e de um desertor do exército francês que no meio da trapalhada da retirada, se tenha esquecido de voltar às fileiras e de quem as fileiras se tenham esquecido.


Na verdade, incomodava-me o recolhimento a que o meu vizinho e amigo, Manuel do Freixo se estava a remeter e não o dispensei da conversa sem voltar a insistir que o achava estranho, muito diferente daquilo a que estava habituado a reconhecer nele.


Depois de mais uns minutos de conversa, o meu amigo Manuel lá começou a desenovelar o problema que o afligia.


- Sabe vizinho?! É que o meu compadre, cada vez que vem cá a casa, atenta-me o juízo, a mim e à mulher, para irmos passar uns dias à casa dele em Lisboa. Ê tenho-lhe dito sempre que nã senhor que tenho aqui munto que fazer na agricultura e que tenho os animais que precisam de ser tratados todos os dias e amais... o que é que vou fazer lá pra casa dele?


Mas tanto ele como a mulher, estão sempre a insistir ca gente pra irmos, pra irmos ver aquilo e as ruas e assim. Tanto insistiram que gente acabámos por pedir a uma vizinha para nos tratar da bicharada e lá fomos, para passar uma semana na casa deles.


-Então ó sô Manel, mas também faz bem mudar de ares e ver coisas diferentes...


-Pois faz vizinho, mas olhe; primeiro, fui-me meter dentro de um andar com gente por cima e por baixo, depois, como aquilo do elevador me faz munta confusão (à minha não faz confusão nenhuma, quela pela-se para andar para cima e para baixo dentro daquilo - olhe caté para ir pró carro, vão no elevador) logo no primeiro dia sobi pelas escadas e ás tantas já não sabia onde estava, nem dava com a saída, disse mal da minha vida. Depois lá apareceu uma mulher que é a porteira, toda cheia de maus modos a perguntar-me o que é que andava ali a fazer. Olhe vizinho, já tava tão xateado que só me apeteceu manda-la aquela parte...


E mais, à nôte, quando já távamos deitados, comecei a ouvir o barulho de água a correr, pensei que alguém tivesse deixado uma torneira aberta e levantei-me, fui ver à casa de banho, nada, fui à cozinha, nada, voltei-me a deitar e a água sempre a correr. Levantei-me outra vez e fui batar à porta do quarto dos mês compadres, quando o compadre me apareceu disse-lhe, olhe que vocemecê tem uma torneira da casa de banho aberta quê tou a ouvir a água a correr. Respondeu-me que não me preocupasse, que era a vizinha de cima a tomar banho.


Diga-me lá vizinho... então a vizinha da outra casa está a tomar banho e a gente ouve como se fosse ali ao pé de nós?


-Pois, é assim em muitos casos sô Manel, nos prédios isso é frequente acontecer.


-Mas ainda o pior, sabe, foi no dia seguinte... eles têm o habito de salevantar pró tarde e eu, alevanto-me sempre cedo, e assim que acordo tenho de me levantar, ir á casa de banho, comer e saír. Assim que me levantei comecei a pensar... quando abrir a torneira da água, vou acordar a casa toda... olhe, até mijei encolhido para não fazer barulho. Depois disse à minha; não vou ficar mais tempo em casa dos compadres, tu se quiseres fica, mas eu vou prá nossa casa, lá é queu me sinto bem. A minha desatou logo num pranto, que ía parecer mal, o que é que os compadres íam dizer, que íam levar a mal concerteza. Olhe vizinho, com tanto pranto e tanta confusão, vesti-me, desci as escadas e vim para a rua, para apanhar ar. Pus-me a andar por ali fora para me distrair e a páginas tantas já não sabia onde é que estava, para cada lado que me virava parecia-me que era tudo igual. Agora é que isto está bonito, pensei cá para mim, como é que vou dar outra vez com a casa dos compadres? Depois lembrei-me de entrar num café e perguntar se alguém conhecia o meu compadre pelo nome. Olhe, aquilo pareciam todos uma vara de porcos a olhar de nariz no ar, nem que sim, nem que não, olhavam para mim como um boi a olhar para um palácio.


Andei naqueles preparos mais de três horas, metia por uma rua, depois por outra, depois por outra e nada de dar com a casa dos mês compadres. Já estava a pensar chamar um carro de praça para me trazer prá minha casa quando apareceram os meus compadres e a minha, todos muito aflitos, a perguntar dondé queu me tinha metido, o que é que andava a fazer ali e sei lá mais o quê. Olhe vizinho, virei-me para eles e só lhes disse; ou vão-me levar já á minha casa, ou então apanho um carro de praça e vou sózinho.


Vamos lá a ter calma, disse o meu compadre. Vamos para casa que está na hora do almoço e depois isso logo se resolve. E lá fomos, almoçamos e depois os compadres levaram-nos a dar um passeio pela Capital, andámos a ver uns largos grandes com umas estátuas de reis e uns jardins também muito grandes e bonitos, até quase à hora do jantar. O problema, foi depois, quando voltámos a casa e ele enfiou o carro num buraco por baixo do prédio e para sair dali, teve de ser outra vez de elevador. Olhe vizinho, deu-se-me um aperto no peito e uma zoeira na cabeça, queu voltei-me prós compadres e disse-lhes, vocês desculpem mas eu não aguento viver aqui mais tempo, tenho de voltar para a minha terra e para a minha casa, para os meus animais e para a minha horta e conversar com os meus amigos, isto aqui não é para mim.


E pronto, depois de jantar, vieram trazer-nos a casa, contra a vontade da minha, mas ê não aguentava estar lá nem mais um minuto.


Ri-me, mas compreendi a angústia do meu amigo Manel do Freixo, um homem que nasceu no monte e tem passado a vida toda na completa liberdade e harmonia com a natureza e os elementos.


-Vá sô Manel, isso agora já tudo passou, já não vale a pena andar aborrecido, vai ver que os seus compadres perceberam que a cidade é para uns e o campo para outros.


-Pois é vizinho... só que a minha ainda anda de trombas...


-Isso passa-lhe, vai ver...


-Que remédio senão passar-lhe... a mim, é que não voltam a apanhar lá por Lisboa!

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Os carros, ou... as pessoas...

Os carros são como as pessoas!

Perdoem-me se afirmo tão peremptoriamente esta semelhança mas, já se detiveram alguma vez a comparar os dois?

Não?

Então, convido-vos a fazer esse exercício:

Comecemos pelo aspecto, ou... pela fisionomia, como preferirmos...

Se olharmos com atenção e durante algum tempo, para a frente de um carro, começamos aos poucos a notar algumas semelhanças com um rosto humano, sobretudo se estivermos em frente de um modelo de carro mais antigo... tipo, anos 50, 60 ou 70. Assim, notamos que à semelhança dos olhos humanos, o carro possui posicionados em cada lado da "face", um farol, o qual cumpre a finalidade de lhe iluminar o caminho. Ao centro da mesma "face", o carro possui um nariz; a grelha por onde entra o ar que vai atravessar as alhetas do radiador que por sua vez arrefece o líquido que irá manter o motor a uma temperatura de funcionamento aconselhável. O mesmo sucede com os seres humanos, que inspiram o ar até aos pulmões e por sua vez, esse ar irá manter, entre outras funções, a da temperatura sanguínea.

Passemos agora ao funcionamento:

Tal como os seres humanos necessitam de se alimentar, para proporcionar ao organismo a energia suficiente para se manter activo e em funcionamento, também os carros necessitam de combustível para que o seu motor funcione. Mas, para que se dê início a esse funcionamento, tanto nos carros como nos humanos, é necessário que haja uma ignição. Nos humanos, essa ignição dá-se à nascença e na maioria dos casos, mantém-se até à morte. Porém acontecem excepções, quando a pessoa por algum motivos sofre de uma perda de sentidos, ou chega a perder por completo os sinais de vida. No primeiro caso, após alguns exercícios, ou de forma natural, a pessoa recobra os sentidos, no segundo, necessita que lhe apliquem o desfibrilhador para que se volte a dar a ignição e a actividade vital seja retomada. Passa-se o mesmo com os carros que possuem uma bateria e um motor de arranque, a primeira que acumula energia eléctrica que transmite ao segundo que por sua vez envia energia para a vela que emite uma faisca, a qual faz inflamar o combustível, o qual misturado com o ar admitido e pulverizado para dentro do cilindro, provoca uma explosão que empurra um piston, o qual, ligado a um êmbolo faz girar um veio em cuja extremidade se encontram rodas dentadas de uma engrenagem que ligada a uma caixa de velocidades e depois a dois veios acopulados às rodas dianteiras ou traseiras, colocam o carro em movimento.

A maior semelhança, contudo, verifica-se a nível de "modelos". Tal como se passa com os carros, também os seres humanos correspondem a modelos específicos; os pequenos e largos, os compridos e esguios, os rápidos, os lentos, os possantes que transportam mercadorias pesadas, os frágeis, os elegantes, os rústicos, os feios, os bonitos, etc.

Mas...(ou, e) tal como os carros, também os seres humanos cumprem a missão de percorrer estradas, auto-estradas, caminhos certos e incertos, becos, pontes túneis, cruzamentos, etc.

E ambos... ao sentir que é chegado o fim do tempo que lhes cabe, recordam com saudade essas estradas, esses caminhos que percorreram e... no caso dos carros, recordam os rostos que conheceram... no caso dos homens... recordam os carros que conduziram...

;))))))

És tão parvinho Bartolomeu... deves achar que tens muita gracinha, deves, deves!

domingo, 3 de julho de 2011

O Espírito Santo

Enquanto depenicávamos umas tirinhas de um saboroso queijo de cabra e bebericávamos em pequenos goles, um moscatel bem fresco, íamos dissertando sobre o estado político e social do nosso país.
Em dada altura, o amigo que me fazia companhia, assumindo um ar desolado e, com o olhar perdido ao longe na paisagem, afirmou sem me olhar: isto nunca mais se levanta, a malta anda toda desmotivada, já ninguem acredita nos políticos nem na justiça... e abanava a cabeça de um lado para o outro enquanto desfiava o rosário de lamentações.
Como não manifestei imediatamente qualquer opinião acerca do que acabara de dizer, o meu amigo voltou-se para mim e perguntou: não és da mesma opinião?
Em parte, respondi-lhe.
-Em parte, como? Não notas que anda toda a gente descrente e desmotivada?
-Sim... mas, em minha opinião, aquilo em que muitos deixaram de acreditar, chama-se Espírito Santo!
-Bah! Lá vens tu com a conversa da religião...
-Espírito Santo é algo muito diferente de religião, meu amigo. Espírito Santo é vontade, é fé mas, fé no futuro, um futuro que tem por base a união de todos os seres humanos.
Olhou-me novamente com os músculos do rosto contraídos...
-Que é que estás para aí a dizer, pá?
-Falo de algo simplicíssimo, algo de que todos falam mas de que poucos fazem uma correcta interpretação e, a que poucos dão a devida importância. Diz-me uma coisa... já rezaste, tenho a certeza. E no final da oração, fizeste o sinal da cruz e proferiste as palavras sacramentais, evocaste o nome do Pai, tocando a testa com as pontas dos dedos da mão direita, do Filho, tocando com as pontas dos dedos da mesma mão na zona do peito e, do Espírito Santo, tocando com os dedos no ombro esquerdo e em seguida no ombro direito, finalizando com a palavra sagrada Amen. Alguns historiadores e antropólogos, são de opinião que a origem dessa pelavra, remonta ao culto egípcio a Amon, considerado pelos egípcios, o deus dos deuses, criador de toda a vida. Bom, mas isso agora não está em análise. Referia-me ao sinal que é feito quando se evoca o Espírito Santo, após ter-se evocado o nome do Pai, em cima e o do filho em baixo e... como todos muito bem sabemos, de uma forma ou de outra, aquilo que a Humanidade tem buscado ao longo de toda a sua existência, tem sido precisamente a forma de estabelecer a ligação, a comunicação entre o Pai e o Filho, entre aquilo que está em cima e aquilo que está em baixo. E é num determinado ponto, a meio do caminho entre o Pai e o Filho, que se encontra o Espírito Santo, o Espírito Unificado dos Homens, a caminho do Futuro!
Notei que aquilo que acabara de dizer, fêz o meu amigo reflectir. Fêz-se silêncio durante alguns momentos. Por fim lá concluiu... - vou reflectir melhor acerca disso e depois voltamos a falar!
;)

sábado, 2 de julho de 2011

Quem?!

Quem não se deixou já conquistar pela força indomável do desejo?
Quem, não socumbiu à sedução, à vontade forte de provar, de possuir... de saborear?
Quem, não se abandonou impotente à avassaladora volúpia, à inebriez de um prazer?
Quem não foi já, vítima desse desejo?
Quem, não viu os seus desejos serem desejados, serem assaltados, conquistados pelos desejos dos outros?
Quem não sentiu os olhares maliciosos do desejo, cravados no seu olhar?
Quem não chorou já, noite dentro, possuído pela raiva do desejo ardente?
Quem não gritou já, do cimo de uma ponte, do alto de um prédio... do fundo de um mar... pelo desejo de um desejo?
Quem?!