sábado, 28 de abril de 2012

Vai-te Embora...

Ha um Homem que caminha à minha frente, pela mesma estrada. Separa-nos uma curta distância que apesar dos esforços, não consigo vencer. Caminha à frente, escolhendo sempre os mesmos caminhos por onde sigo, e ainda não vi o seu rosto, não conheço o seu nome. Se o chamo, não me escuta. Se me detenho, cansado, e me sento na beira do caminho, ele não para, continua a jornada mas, quando me levanto, ele aparece instantâneamente, à minha frente, sempre À mesma distância de mim, sempre voltado para frente, nunca, deixando que lhe conheça o rosto. Veste como eu, caminha do mesmo modo, mas nunca se volta para trás. Noto que sabe sempre por onde passou e o que já viu... pois é transparente e, à transparência, consigo ver-lhe todos os registos dos nomes e imágens que já conheceu. Caminha à minha frente, não fala, por vezes, quando o vento sopra de frente, julgo escutar um murmúrio, como que, uma melodia antiga... ha dias pareceu-me que trauteava uma velha lenga-lenga... vai-te embora papão negro, de cima desse telhado... deixa dormir o menino... um soninho descançado... vai-te embora...

19 comentários:

Interessada disse...

vai-te embora papão negro, de cima desse telhado... deixa dormir o menino... um soninho descançado... vai-te embora...

Interessada disse...

Aterrados, mas jamais admitiremos de forma definitiva o curso dos acontecimentos.

Cristina Torrão disse...

Esse é o homem que já foste, ou que ainda hás-de ser?
Ou há uma criança dentro de ti a precisar de protecção e consolo?

Bartolomeu disse...

Interessada; eu diria: sempre empenhados em descobrir o indescobrível, em dizer o indizível e... em atingir o inatingível...
;)))

Bartolomeu disse...

Cristina; talvez seja o modelo de homem que persigo e em que julgo gostaria de me tornar...
;)

James Dillon disse...

Muito constato, muito concluo, procuro as palavras certas, aquelas quem em menor medida irão corromper meu pensamento, baixo os braços antes de os esgar se tornar gesto, percebo que palavras de outro munido de mente mui mais vasta e complexa, constituído de pensamentos profundos e subtis já disse o que eu penso, sem praticamente qualquer sujidade na tela,

""Vem por aqui" — dizem-me alguns com os olhos doces
Estendendo-me os braços, e seguros
De que seria bom que eu os ouvisse
Quando me dizem: "vem por aqui!"
Eu olho-os com olhos lassos,
(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)
E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:
Criar desumanidades!
Não acompanhar ninguém."

*excerto retirado do Cântico Negro de José Régio,


talvez o trilho não seja aquele do teu futuro ou passado, talvez seguir o mar rasgado pelo casco sujo de uma qualquer fragata não seja o propósito, talvez a saída se encontre naquele pedaço de terra que ainda não galgaste e mais importante nunca pensaste algum dia atravessar.

Por onde vais agora talvez já tenhas ido, talvez fiandeiras nórdicas tenham previsto que é suposto ires, mas te garanto, podes ir mas não é por aí.

Cumprimentos.

Bartolomeu disse...

Nunca é por ali, James... dizem-no as runas, mas será sempre por aqui, atrás daquele homem que segue adiante, pisando-lhe milimétricamente as pegadas...
Não ha desvio nem atalho, mesmo quando pensamos que o caminho que pisamos é virgem... eis que ele nos surge adiante, sempre de costas voltadas e sempre a uma distância que o torna inatingível... é o nosso caminho, segui-lo... sempre!
;)

James Dillon disse...

Fiandeiras agarradas a naperons tecidos com linhas untadas em metais raros, em palácios enormes que dão trinta e três voltinhas por minuto, para nunca perceberes se por onde entraste se pode sair, em salas enormes que oferecem de bom grado ecos a cada passo tenaz que forneces ao soalho envernizado, elas gordas, magras, bonitas e feias, femininas e masculinas entregam-se a desenhar toscamente o que se espera de nós,

recostas-te para trás sorris perante o teu fado marado parido entre naperons e runas de cegos tolos, acatas sem um bracejar de protesto o inexorável destino, a megera deste destino?


cumprimentos :)

Bartolomeu disse...

Mencionaste megera, James... ou pareceu-me?!

Sete fadas me levaram
Suavemente num sonho
Em três lagos me banharam
Num ambiente risonho

Em nove bosques me sararam
Dançaram-me ao luar.
D´um sonho me acordaram
Profundo, feito mar.

Depositaram-me no orvalho
Sobre violetas aos molhos.
À nona semana renascido.
Suspirei, abri os olhos,
numa manhã de poalho
Vi-te, por trás de um manto tecido.

Dei-me ao mundo com amor
Mas o mundo me tragou.
Dei-me a ti com alegria
Dei-me ao amor que te roubou.

Bebeste-me em cálices de pedra!

;)))

James Dillon disse...

(risos)

e um touché bem cantado,

parece-me uma "fábula fabulosa",

- que se passa pá?, que tás a ver pá?,
- são megeras pá, centenas pá,
- arre santas Erínias,

errata:
indubitavelmente uma "fábula fabulosa",

cumprimentos:)

Bartolomeu disse...

Sim, sim... trata-se de uma fábula fabulosa; adaptada. Como cada momento das nossas frágeis existências e das nossas férreas vontades...
;)))

James Dillon disse...

indubitavelmente,

(aplausos)

Interessada disse...

Gargalhada para o diálogo com o James.
Boa caminhada Bart.

Bartolomeu disse...

Interessada,
Não te parece que as caminhadas só poderão sê-lo, desde que todos ponham pés ao caminho?
Então bora lá, dá aí a tua mão...
;))

Interessada disse...

Não sei onde desagua a torrente que nos levará, mas pior inferno que este, certamente não será.

Olinda Melo disse...

O teu texto apresenta-nos um homem à procura de si mesmo, com questões existenciais.Nos tempos que correm, mas também em qualquer outro tempo, é bom recorrermos a esta parte de nós para nos analisarmos e reajustarmos o nosso rumo. Um belo exercício!
Também gostei do 'despique' dos comentários. Pelo toada fizeram-me lembrar a Nau Catrineta, na parte que diz 'mais enxergo três meninas debaixo de um laranjal...'

Abraço

Olinda

Bartolomeu disse...

É verdade Olinda!
No entanto, um Homem que na busca de si mesmo, não faz outra coisa que pisar as marcas que outros homens antes di si, vão deixando marcadas num solo que sempre pareceuà raça humana, imundo e incapaz de lhe proporcionar algo, que fosse coincidente com os seus anseios.
Portanto... um Homem sempre incompleto, mas sempre em busca da tal árvore da sabedoria, que lhe permita um dia, cumprir os desígnios para os quais julga terá sido criado.
Em suma... uma caminhada infindável, mas sempre com um horizonte aparentemente definido.
;))

Bartolomeu disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
James Dillon disse...

Alguns gostam de castrar o bandido do destino, não pode o imberbe ter escapado às correntes que o amordaçam e estar em busca de boémia, persegue-o vá, para dares contigo nos reinos de Baco ou algum familiar.


Cumprimentos.