quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Para quê ler livros?

Quanto maior é o número de obras literárias já lidas, quanto mais informação acumulo num espaço interiormente dividido, maior é a sensação de vazio intelectual que experiencio.
Tudo já me sabe a dejá-vu. Tudo me parece impossível de alterar de melhorar, de tornar apetecível, capaz de constituir motivo de incentivo... ou de mobilização, seja para o que for.
Sinto apoderar-se de mim uma inquietação, uma desconfiança de que algo está a aproximar-se. Algo indefinível, algo que tanto pode ser o resultado apurado de tudo, como a extinção do que se conhece.
Sento-me para ler, sempre na esperança de que alguém tenha escrito o que irei ler pela primeira vez e me irá conduzir a uma nova perspectiva.
Experimento por vezes despejar a mente de qualquer pensamento, como quem limpa a casa de poeiras, por forma a receber condignamente os visitantes, de modo a que, ao sentirem que estão num ambiente limpo, incorrupto, se abram em revelações, como girassol ao receber os primeiros raios de luz.
Mas logo, após as primeiras frases, sobrevem o sentido, o mesmo sentido, dito da mesma forma, folha após folha... nada de novo.
Tal como os dias. Um, após o outro, iguais, previsíveis, despidos de tudo o que os possa tornar vibrantes, entusiasmantes, espaços ilimitados para o acontecimento.
Nem uma página lida, e devolvo o livro ao seu lugar na estante, volto-me para a janela, saio para a varanda, o terraço, depois, o jardim. Encontro ali tudo, as flores, as mesmas, as árvores, também. Ergo os olhos e juro que aquela nuvem é a mesma da semana passada... que se não for, é parente da outra, aquela que passou lentamente, de Sul para Este, no dia em que plantei aquele limoeiro. Sim... foi nesse dia, porque na semana anterior tinha semeado favas e na outra...
Afinal... não passo de um coleccionador de datas... para quê ler livros?

10 comentários:

Catarina disse...

: ) Estás a passar por uma fase existencialista, Bartolomeu?
Lembra-te: Nada permanece na mesma, tudo se transforma...
Com toda a certeza, que neste momento, não és a mesma pessoa que escreveu esta crónica que deixou transparecer um grande tédio (a minha interpretação); Vai ao terraço, ao jardim e verás como vais encontrar algo de novo que nunca até agora reparaste. Open your mind, my friend! : )
Difícil imaginar-te neste estado de espírito...
Abraço

Bartolomeu disse...

Acho que não sou só eu, Catarina. Acho que o nosso país em geral, está a passar por essa fase.
Vive-se uma situação ambígua, de absoluta e geral desorientação. Não surge ninguem imbuído de um espírito idealista, determinado a conduzir, a apontar um sentido, um rumo, a este povo.
Aquilo que se percebe é que existem ressabiamentos, invejas e desejos de vingança de uns pelos outros, sem que os mesmos sejam claros e definidos. Não se reconhecem culpas nem culpados, nem vítimas.
Portugal é um imenso caldeirão onde resignadamente todos nos encontramos mergulhados, cozendo em lume brando, sem que alguém tome a iniciativa de tentar entorna-lo.

Catarina disse...

Falando agora a sério, compreendo o que estás a dizer e lamento. As coisas por aqui também se estão a modificar aos poucos. Abraço

Rosa dos Ventos disse...

Às vezes também sou assaltada por essa sensação mas apesar de tudo ainda consigo surpreender-me com algumas combinatórias semânticas!

Abraço

Olinda Melo disse...

Este vazio perpassa irremediavelmente por cada um de nós, cada dia que passa. Passar à tábua rasa? Adoptar o empirismo no intento de que todo o saber vem da experiência? Isto pressuporia a adopção de tais conceitos. Bom mesmo seria retornarmos à inocência, ao princípio das coisas...

(Obrigada pelo endereço do video.Adorei)

Abraço

Olinda

Bartolomeu disse...

;))))
Parabéns Rosinha! Por ainda conseguires encontrar na semântica, a energia capaz de operar um processo de regeneração.
;)))

Bartolomeu disse...

Sabes Olinda?!
Questiono-me imensas vezes, se o mundo, e a vida, não serão compostos de infinitos nada(s)...

Interessada disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Interessada disse...

Para que aconteça algo de novo não precisamos de espaço e muito menos de despejar a mente.
Parece-me que basta ver sob uma perspectiva diferente aquilo que temos à nossa frente ou em pensamento.E para isso precisamos do que temos na mente.
Será da transformação que se alcança a nova perspectiva, por mais absurda que possa parecer a outros. E há sempre uma nova perspectiva. Não a espere dos outros, porque ela estará dentro de si.
Um abraço

Bartolomeu disse...

A prespectiva é o mais importante, Interessada, tens razão.
Mas por vezes não se encontram prespectivas diferentes, daí o "dejá-vu", o qual... não deixa no entanto, de ser também uma prespectiva, só que, a menos desejável.
;))